quinta-feira, 9 de maio de 2019

PELA FRESTA DA PORTA


Por: Shirlei Noveleto


Eu deixei a porta entreaberta, era a forma que encontrei de te dizer que você poderia voltar; sentei no sofá laranja, me recordando do quanto nos divertimos colorindo a nossa casa... cada detalhe contava nossa história, e olhando para as paredes eu chorei a tua ausência.

Quando você atravessou aquela porta, um pedaço de mim também foi embora, eu desaprendi a andar na rua sozinha, suas mãos me fazem falta, o lugar vazio na mesa me tira a fome, e dormir tem sido difícil, o lugar vago ao meu lado me fez entender que eu te amava bem mais do que eu sabia.


Eu guardei nas gavetas vazias que você deixou, os porta-retratos das nossas últimas viagens, gostaria de poder fazer o mesmo com minhas lembranças, mas ainda não inventaram gavetas pra guardar as memórias dos dias felizes... esses dias não consegui resistir, e acabei folheando o nosso álbum de casamento, e mentalmente repeti as juras de amor eterno que você não conseguiu cumprir.
Levei um tempo para lavar os lençóis, de alguma forma me recusava a tirar seu cheiro de perto de mim, ou pelo menos o que restou dele, no travesseiro que você se esqueceu de levar.


Chorei de novo, encolhida no sofá laranja, pela fresta da porta, apenas o vento frio das noites que em claro eu passaria...
• Eu vi cada conquista nossa, tornando-se apenas objetos, os móveis já não eram suficientes pra preencher os espaços, o vazio tomava conta, e as janelas eu nunca mais abri, porque eu sabia que nem mesmo o sol seria capaz de me tirar da escuridão... era como se aquela história não fosse mais minha, a dor tem uma capacidade imensa de apagar os registros, aqueles que achei que estariam pra sempre impressos em mim...
Eu olhei novamente pela fresta da porta, não mais esperando você entrar, mas tomando coragem pra sair.

Ontem a vizinha da frente me ligou, disse que você esteve procurando por mim... mas o sofá laranja não era mais suficiente, eu já não cabia mais nele, assim como você já não cabe em mim.

Nenhum comentário:

Postar um comentário