terça-feira, 4 de setembro de 2018

COMO É SER FELIZ???

Por:  -  Shirlei Noveletto


 Já passava das oito, como sempre eu estava atrasada, tinha dormido pouco na noite anterior, alguns pensamentos me tiraram o sono, uma angústia que eu não conseguia explicar, ao meu redor o apartamento recém mobiliado... estava lindo, do jeito que eu planejei, mas nem de longe aquele parecia o meu lugar. Me culpava mais ainda pela ingratidão que eu mesma sentia com minhas próprias conquistas, a dificuldade de reconhecer que eu tinha mais do que muitas pessoas, me fazia sentir ainda mais pequena. Eu tinha consciência, mas não tinha controle sobre a dor que sentia. 

 Corri para o ponto de ônibus, deu tempo de embarcar no coletivo e receber o tradicional “bom dia” do motorista, sentei-me na janela, observava as pessoas andando pela calçada, me perguntava se elas eram felizes, se tinham filhos, casa, trabalho, sonhos... e desejava ser uma delas, viver outra vida que não a minha... até o mendigo pedindo esmolas me causava inveja, havia nele uma liberdade que talvez eu nunca conseguisse alcançar. Cheguei na loja em tempo, coloquei meu uniforme, prendi os cabelos, passei uma maquiagem leve e estava pronta! O dia transcorreu normalmente, atendi vários clientes, recebi algumas cantadas que fizeram minhas bochechas rosarem, me diverti com clientes que insistiam em querer entrar em um manequim duas vezes menor, almocei com meus amados colegas, combinamos de ir a praia no final de semana, rimos muito... olhando de fora, eu parecia ter muita sorte na vida, mas por dentro eu era apenas um esboço de ser humano, em uma tentativa desesperada de que alguém enxergasse a dor que eu carregava. 

Não me recordo exatamente o dia que a tristeza chegou em minha vida, foi devagarinho, fiquei com vergonha de pedir ajuda, e ninguém percebeu que eu morria um pouco a cada dia, e tudo foi perdendo a graça, a comida perdeu o sabor, os conselhos não atingiam mais meu coração, os momentos felizes eram tão rasos, o esforço pra tirar esse sentimento de dentro de mim era desesperador, e quando eu escutava as pessoas dizendo que eu era fraca, que não sabia dar valor ao que tinha, que eu deveria rezar mais... mal sabiam elas do meu esforço pra permanecer aqui, nem ideia faziam de quantas noites passei de joelhos rogando à Deus para que me curasse... das vezes que levantei disposta, troquei a cor das paredes, mudei os móveis de lugar, e parecia que ia ficar tudo bem, que eu iria conseguir... e eu ficava contente com meu feito, olhando ao redor com orgulho o resultado da minha nova decoração, mas de repente o sorriso ia embora, não fazia sentido mais nada... mais nada fazia sentido. Não me julguem, é só o que eu peço, não foi fraqueza ou covardia, eu tentei, juro que tentei... o médico disse que os remédios me ajudariam, ele estava certo, o que eu fiz foi apenas mudar a dosagem... em poucos minutos a cartela estava vazia em cima da cama, deitei calmamente sobre o edredom que mamãe me deu de aniversário... os maus pensamentos foram embora, e eu descansei.

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